ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DO ESTADO DO ES
segunda-feira, 31 de dezembro de 2018
sexta-feira, 27 de julho de 2018
sexta-feira, 6 de julho de 2018
terça-feira, 19 de junho de 2018
ARAME FARPADO
Sempre me percebi espreitando as coisas. Nunca
consegui me enquadrar em sistemas, mas não acho danação ser assim. Constantemente, me vejo às margens, na beira
mesmo, tentando dali observar meus espaços por outro lado. Identifico-me com
Drummond e me desenho “gauche” na vida, nas estradas que construo e mesmo
derrubo, nas pontes e vielas que refaço pra mim. Não me vejo enquadrada nos
discursos e nos ecos impostos pelos outros. Vago, sorrateiramente, entre
desníveis e nas impossibilidades e, ali, reinvento minha não existente forma de
ser feliz .
Mastigo novos desejos e ordens que não sentencio,
invado cenários não feitos para mim e consigo dissimular receios e medos que se
misturam nas minhas vestes de humanidade. Vagueio nas beiras de caminho e não
recrimino outras verdades. Nem procuro me moldar nos potes e rótulos que
inventaram e acharam que me coubessem. Não sou sólida, deslizo demais e
desconsidero ser uma mesma mulher todos os dias.
Gosto de experimentos, de sentimentos inaugurados em
meu corpo e novos braços e pernas. Espero beijos mesmo sem perdões e sei que
sou desajustada, carente de muitas coisas, que sei não serem saciadas. Não
costumo marcar territórios, nem tão poucos escutar a mesma música . São nos
desvãos que tento passar, correr sei lá... e dizer o não dito, traçar o que nem
idealizado foi. Sou do acostamento, becos e não estradas. Quero sugerir e não
delimitar. Os limites empobrecem as vontades e sou consumista mesmo...
Entre frestas e nesgas, traduzo meus recados e inundo
meus hemisférios. Gosto de dizer quando há o silêncio, quando palavras cansaram
de ser gotejadas. Às vezes, cuspí-las é necessário. Não suporto ouvir os mesmos
vocabulários e as reticências não denunciadas.
Sou oscilante e variável. Não tenho a solução, mas
costumo criar muitas perguntas. É chato não ter incertezas, é entediante não
mergulhar. E nisso estou em me especializando. Gosto de sentar no chão.
Cadeiras e sofás me deixam confortável demais. E, no desconforto, lanço-me
centenas de vezes, todos os dias.
Sou desajeitada, não caibo em muitas roupas, em modas
e em muitas gentes. Mas, me intensifico com outras, com olhares que se
espalham. Gosto de visitar muitas casas, de ter mais endereços e aproximar-me,
embora me afaste com frequência. Gosto de andar na contramão, entre lacunas e
arames farpados, entre o que não considero e o que considero improvável.
Simone Lacerda
Biografia:
Simone Lacerda é graduada e pós- graduada em Letras, com ênfase em
Literatura Portuguesa e Brasileira e estudante de psicanálise, atuando como
docente de Língua Portuguesa desde 2004.
Em 2011, criou o blog
Cheiros, ensaios e poesia, no qual divulga textos autorais, como poemas,
crônicas e contos.
Escreve, semanalmente, para
o Jornal Espírito Santo de Fato e contribui para publicações para a Revista
Cachoeiro Cult, Jornal A Gazeta e outras mídias digitais de cunho literário.
No ano de 2016, foi
selecionada pelo edital da Secult do Estado do Espírito Santo para produção e
lançamento de seu primeiro livro Arame farpado, o qual reúne 38 crônicas, com
características bem poéticas , abordando temas que perfazem o cotidiano e o
sujeito contemporâneos.
sexta-feira, 15 de junho de 2018
quarta-feira, 23 de maio de 2018
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